Co-fundador e presidente-executivo da Beta-i
Artigo incluído na edição de Fevereiro 2019
Janeiro aí está, sempre pródigo em análises, decisões, resumos e avaliações. Neste contexto, ter boas bases de avaliação e métricas comparáveis representa sempre uma mais-valia. Mas depois há aquele outro aspecto: como classificar o ano anterior, tirando dele apenas o melhor para transferir para o ano seguinte?
Para termos algum contexto, há 10 anos, o conceito de start-up era quase desconhecido, e a maioria olhava com grande desconfiança para o investimento no capital de risco e na afirmação de Portugal como um hub de inovação. No entanto, e olhando para as notícias recentes, não deixa de ser surpreendente como deste ambiente surgiram três novos unicórnios: Farfetch, Outsystems e Talkdesk.
Convém não esquecer que, durante a crise, as start-ups começaram por ser um dos drivers de crescimento e afirmação da nova dinâmica de Portugal, e apesar de hoje se falar cada vez mais de grandes empresas e de unicórnios, é importante sublinhar a importância de continuar a apostar em start-ups nas fases iniciais e de atrair e reter cada vez mais start-ups internacionais, criando condições para que fiquem cá. Isto quer também dizer que não devemos “varrer para debaixo do tapete” insucessos recentes, como o da CoolFarm, que chegou a estar altamente cotada e encerrava grande potencial. Se há aqui uma lição, é de que é importante que os investidores saibam estar nos boards, que confiem e trabalhem com os empreendedores para conseguirem executar a melhor estratégia. Acima de tudo, uma relação entre investidores e empreendedores deve ser uma relação de parceria e entre pares.
Serve tudo isto para dizer que há muito a tentação nesta altura, quando revemos o ano anterior e projectamos o seguinte, para reter apenas a informação mais relevante, mais impactante. Mas “o Diabo está no detalhe”, já dizia o outro. Há pequenas notas e indicações, um pouco por todo o lado, que nos passam muitas vezes despercebidas, mas que, se filtradas, traduzem tendências, novos paradigmas, possíveis pistas para caminhos a seguir. Parte da missão de uma plataforma de inovação como a Beta-i é estar atenta a essa realidade, e criar esse awareness. A economia digital veio para ficar, e encerra lógicas que desafiam os modelos de negócio tradicionais, os players incumbentes e os modelos clássicos de educação.
Estamos cá desde a origem do ecossistema, e sabemos que o grau de maturação que começa a surgir e que permite apresentar já 3 unicórnios foi feito com muito esforço e dedicação, com muitos “nãos” a pedidos de reunião e com muitos “façam isso com metade do orçamento”. É preciso uma comunidade inteira para criar um empreendedor… Numa altura em que viramos o ano, importa celebrar as vitórias, sabendo que Lisboa está finalmente no mapa da globalização digital, mas não podemos esquecer-nos do caminho que nos conduziu aqui, o que quer dizer que não podemos nesta fase cometer erros por facilitismo. É crítico continuar a inovar, é crítico continuar a apostar neste ecossistema, pois só assim podemos construir uma economia mais robusta, e que fique a salvo de factores de moda, nearshoring ou ciclos políticos.
Relembrando um sábio ditado popular, espero que tenhamos a capacidade e a inteligência para não “deitar fora o bebé juntamente com a água do banho”, agora que a pior fase já faz parte do passado.