A forma como Mariana Vieira deu os primeiros passos no Youtube pode ser descrita através do clássico “juntar o útil ao agradável”. No canal que era apenas um hobby inicialmente, a criadora publicava conteúdo com origem no que já fazia diariamente para o curso de Direito: a forma como fazia apontamentos, a sua agenda, dicas de estudo. Foi há oito anos que se juntou à categoria da produtividade no digital, e hoje, além de jurista, é criadora de conteúdo a nível profissional. “Acho que a produtividade pode ser algo mais intencional, não é necessariamente termos uma agenda preenchida, mas uma agenda preenchida com as coisas que queremos fazer”, explica à Forbes.
Quem lhe deu a ideia foi uma amiga, a mesma que ainda hoje edita todos os seus vídeos. “Fiz um vídeo sem expetativas nenhumas, muito amador. Fui buscar a câmara do meu pai, tudo filmado com uma luz artificial horrorosa na minha secretária. Fiz esse primeiro vídeo, esqueci-me dele, tinha muitos exames na altura, e no verão, quando voltei a abrir o canal, reparei que havia já muitos comentários”, diz. A partir daí, o crescimento nunca mais parou. Hoje, o canal tem mais de 766 mil subscritores. E já passou por várias fases.
Inicialmente, a youtuber optou por não aparecer na frente da câmara e gravar apenas a sua voz. Só mais tarde, há cerca de quatro anos, decidiu mostrar o seu rosto. “Antes, toda a gente me imaginava de uma certa forma, e a partir do momento em que conseguiram associar aquele conteúdo a um rosto sentiam também uma conexão muito superior. Foi aí que comecei a receber mais mensagens”, afirma. O que nunca mudou durante todo este processo foi a opção de falar em inglês, chegando a um maior número de pessoas. A grande parte dos seus seguidores está nos Estados Unidos.
Quem também não ignora a área da produtividade no digital são as marcas, algo que já não surpreende ninguém. As redes sociais são um negócio, e é escusado ignorá-lo. “Quem gosta de produtividade gosta sempre de encontrar novas oportunidades de autodesenvolvimento e de encontrar ferramentas novas para melhorar o seu trabalho. Acaba sempre por ser um público que tem muita tendência a gostar da próxima coisa, ferramentas novas, novas plataformas educativas. Portanto, sim, sinto que as marcas continuam a apostar muito e sobretudo gostam de fomentar relações a longo prazo com os criadores”, explica Mariana.

A youtuber portuguesa trabalha apenas com marcas internacionais. Em relação aos valores, um pouco à imagem da maioria dos criadores de conteúdo, não trabalha com um preço de tabela. Cada valor que define para um trabalho depende de vários fatores, como as características da audiência ou o histórico com a marca, caso já tenham trabalhado antes. O valor varia também consoante a duração da parceria: “Tanto pode ser uma menção de 45 segundos no final de um vídeo como pode ser um vídeo de 10 minutos exclusivo. Tudo isso pesa imenso. Acaba por ser negociado caso a caso”, diz.
Produtividade positiva
A produtividade é uma categoria muito grande dentro das plataformas digitais, e, como em todo o lado, cada pessoa defende aquilo em que acredita. No caso de Mariana, os conteúdos com os quais mais se identifica passam pela produtividade intencional, o agendamento de tarefas e a capacidade das pessoas de continuarem a aprender.
“Gosto de quebrar um bocadinho o mito de que somos todos muito ocupados, normalmente estamos ocupados com coisas que não são muito importantes, muitas vezes podem ser delegadas ou adiadas”, diz.
Mas nem todos os youtubers defendem as mesmas coisas. Alguns caem no extremismo e nas rotinas impossíveis de seguir, outros optam por contrariar seja o que for que é dito na área da produtividade. Mariana é das que criam conteúdo, mas partilha de algumas opiniões dos segundos.
“Tudo o que são fórmulas demasiado restritivas de produtividade, sou contra. Acho que a vida da maior parte das pessoas não se consegue conciliar com esses métodos. Um caso muito típico é a questão de acordar às 5:00 da manhã. Acho muito bem quem o faça, eu neste momento tenho de o fazer porque tenho um bebé, mas não é por querer ou achar particularmente produtivo. Acho que o importante é que todas as pessoas consigam conciliar as suas atividades com a rotina e com os níveis de energia que têm”, defende.
Profissão: Várias
Quando as redes sociais se tornam uma profissão, o mais frequente é o criador de conteúdo deixar de lado a área em que estava. Mas Mariana continua a conciliar o trabalho de jurista com o digital. “Em primeiro lugar, o Youtube é uma coisa que eu tenho conseguido manter com regularidade há muitos anos, mas ninguém me garante que se vai manter. Por outro lado, a verdade é que eu também gosto da minha área, tive seis anos de educação em Direito e também não queria desperdiçar todo esse projeto”, diz.

E não ficou por aqui. O trabalho na área da produtividade acabou por sair do canal do Youtube, e Mariana criou o seu serviço de coaching há cerca de três anos. Além deste acompanhamento a longo prazo, lançou também um curso direcionado a quem quer começar do zero e melhorar a gestão dos seus dias.
Como? “Passinhos de bebé, é a minha dica principal”, diz Mariana. “Começar por um lado que tenha um impacto muito positivo nas pessoas. Geralmente, pela minha experiência, isso é o calendário. A verdade é que não há um método certo, temos de encontrar o método certo para nós, isso implica muita pesquisa, implica muita experiência. E ter uma mente aberta para experimentar várias coisas até encontrar aquilo que mais se adapta ao nosso estilo de vida.”
Por outro lado, Mariana também tenta que as pessoas entendam aquilo que não devem fazer. Porque, apesar de ser relativo, como já foi mencionado, a Internet está cheia de processos que não se adequam a um dia a dia normal.
“Nunca encher um calendário ou uma agenda só na perspetiva de estar ocupado. Nunca dizer que sim a tudo só para sentir que temos uma agenda preenchida, isso não faz qualquer sentido. E, no geral, nunca fazer isso relativamente a qualquer método de produtividade. Não acordar às 5:00 da manhã caso sintamos que somos definitivamente pessoas que funcionam melhor à noite. Contrariar os nossos sistemas naturais nunca funciona”, conclui.
(Artigo publicado na edição de outubro/novembro da Forbes Portugal)