A elegância contra a máquina

Kevin Plank está a ficar com calor. O sol entra pe­lo escritório da Under Armour adentro em No­va Iorque, um espaço cuja decora­ção e disposição mais lembra um ginásio, cheio de jovens designers e pilhas de camisolas de néon e cal­ções desportivos de material elás­tico. Plank veste um fato cinzento de flanela feito por medida…
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Kevin Plank, da Under Armour, gastou quase meio milhão de dólares em aplicativos de fitness para smartphones para superar Silicon Valley.
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Kevin Plank está a ficar com calor. O sol entra pe­lo escritório da Under Armour adentro em No­va Iorque, um espaço cuja decora­ção e disposição mais lembra um ginásio, cheio de jovens designers e pilhas de camisolas de néon e cal­ções desportivos de material elás­tico. Plank veste um fato cinzento de flanela feito por medida e está a pagar por isso. Salta do cadeirão de cabedal para um sofá à sombra. A nossa conversa centra-se no fu­turo das suas aplicações (apps) de fitness e dos relógios e braceletes que monitorizam os batimentos cardíacos. Plank começa por fa­lar mal dos seus rivais, como de costume.

A maior parte da tec­nologia, segundo ele, é desinte­ressante e ineficaz, feita por pes­soas que são um atentado à mo­da em Silicon Valley. E refere o iró­nico que é ter gente do mundo da tecnologia a ditar a moda na área dos dispositivos. “São Francisco é uma das cidades mais mal vestidas do mundo, senão mesmo a pior… Já ninguém se arranja?”

Os escritórios da Under Ar­mour em Baltimore, no Estado de Maryland, estão longe do epicen­tro da tecnologia aplicada à roupa e aos acessórios, mas este merca­do está a crescer mais rapidamen­te do que o mercado de vestuário desportivo. As vendas combinadas de apps móveis na área da saúde e dos dispositivos deverão atingir os 113 mil milhões de euros em 2020. Plank não se poupou a esforços e não parou até colmatar essa fa­lha na sua empresa.

A Under Ar­mour gastou 110 milhões de euros na app de exercícios MapMyFit­ness em Novembro de 2013, e em Fevereiro de 2015 pagou 424 mi­lhões de euros pela app de conta­gem de calorias MyFitnessPal e 76 milhões de euros pela app euro­peia de fitness Endomondo. Com 62 milhões de pessoas a usarem uma das suas apps pelo menos uma vez por mês, a Under Armour controla agora a saúde digital mun­dial. Custou a Plank só o equiva­lente aos três últimos anos de lu­cros antes de impostos.

SOBREVIVER NA “SELVA”

A lista de fabricantes de vestuá­rio que conseguiu dar o salto pa­ra a área da tecnologia é muito reduzida ou praticamente nula. A Nokia passou do fabrico de botas de borracha para o fabrico de tele­móveis e veja-se o que lhe aconte­ceu. E até mesmo a poderosa Ni­ke acabou por abandonar a sua FuelBand quando a Apple anun­ciou o lançamento de um relógio inteligente.

Plank não está preocupado se as suas apps fazem muito dinhei­ro. Já tem bastante. Tentou investir cerca de 250 milhões de euros em Kevin Durant, poste na equipa de basquetebol Oklahoma City Thun­der, mas a sua oferta foi ultrapas­sada pela Nike. Existem apps que foram concebidas para fazer com que as pessoas façam mais exercí­cio e comprem mais roupas e ves­tuário desportivo. E é isso que mais importa para Plank. Este milioná­rio de 43 anos subiu pelo seu pró­prio pulso, acertou muitas vezes, ignorando os pessimistas. Jogador de futebol americano na equipa da Universidade de Maryland, come­çou por desenhar e vender camiso­las que absorvem suor a partir da cave da sua avó em 1996, criando a Under Armour, empresa que vi­ria a tornar-se no segundo maior vendedor de vestuário desportivo nos EUA, logo após a Nike.

A cota­ção das suas acções subiu 16 ve­zes desde a entrada em bolsa em 2005, que se repercutiu numa ca­pitalização bolsista actual de 19 mil milhões de euros. As vendas des­te ano deverão baixar um pouco e ficar abaixo dos 3,8 mil milhões de euros mas o objectivo declara­do pela empresa é de chegar aos 7 mil milhões de euros em 2018. Os lucros cresceram 21% ao ano nos últimos quatro anos, mas o cres­cimento internacional da Under Armour ficou aquém disto.

A ana­lista de acções da BB&T, Corin­na Freedman, afirma que a úni­ca coisa que os investidores que­rem saber sobre os 710 milhões de apps é “como é que isto vai ajudar a vender mais camisolas e sapa­tos.” Plank concorda plenamente. Durante anos num grande quadro no seu escritório constava a frase: “Não esquecer de vender camiso­las e sapatos.”

FOCO NA INOVAÇÃO

Acertar na tecnologia certa é mais difícil do que bater a Nike. Em Ja­neiro, a Under Armour lançou uma app de monitorização da saúde, do sono e fitness denominado de Record. Funciona com uma série de dispositivos de outras empre­sas e recebeu boas críticas. Mas, dada a existência de centenas de aplicações rivais, poucas pessoas descarregaram esta app. Plank espera que isto mude com o lan­çamento de uma nova versão no início de 2016 e mostra à FORBES protótipos do novo interface para iPhone 6: um grande círculo que ocupa grande parte do ecrã, com números espalhados pelo mesmo para registar passos, sono e até o “estado” geral da pessoa.

Esta app funcionará numa série de dispo­sitivos, incluindo numa bracelete de nome Grip, concebida pelo fa­bricante de smartphones HTC, que sairá no início do próximo ano de­pois de o seu lançamento, previsto para a Primavera de 2015, ter si­do adiado. Uma equipa secreta em Baltimore está testar a inserção de sensores sofisticados em camiso­las de treino. Sobre isso, Plank ad­mite, “estamos mais longe do que gostaria.”

Parte do sucesso da Under Ar­mour depende também do desen­volvimento do mercado. E quanto a isso, Plank considera que ainda falta muito caminho a percorrer. A Apple, por exemplo, até agora só vendeu 3 a 4 milhões de reló­gios e terá de conseguir que este produto se torne tão desejado co­mo os demais produtos da marca. O Fitbit vendeu mais de 20 milhões de dispositivos que monitorizam o estado do corpo e fez 421 mi­lhões com a sua entrada em bol­sa em Junho, mas as suas acções acabariam por baixar para o nível de quando foi lançada. A Jawbone atrasou o lançamento da sua mais recente bracelete e é conhecida por desistir de alguns produtos.

Todos se têm debatido para convencer consumidores cépticos. “Já as ex­perimentei todas”, afirma Plank, tirando o casaco para mostrar os seus pulsos sem nada. “Acho que todos têm problemas de execução. Dizem que demos 8 mil passos on­tem, mas não dizem o que fazer com isso,” afirma levantado o so­brolho. E até o mais recente soft­ware de monitorização do estado de saúde da Apple “não se revelou um grande sucesso.”

A Under Armour afirma que sempre foi uma empresa tecno­lógica e que por isso os seus pro­dutos são feitos para servir uma função, tais como as camisolas de compressão que reduzem o risco de feridas ou tecidos sintéticos que removem o suor do corpo do atleta ou desviam o calor do sol. “Quan­to digo que isto é uma t-shirt da Under Armour, deve-se questio­nar o que é que essa t-shirt faz”, revela Plank enquanto se recosta num sofá de pele e cruza as per­nas. “Nós somos os maiores for­necedores de artigos de vestuário e calçado e fazemos as coisas pa­ra serem usadas.”

ESTRELAS DA MARCA

Na génese da Under Armour está uma constante procura por novas tecnologias que permitam aliar a saúde e o desporto a artigos de vestuário e calçado. O sucesso da empresa está em conseguir figurar constantemente na dianteira deste mercado altamente competitivo. Ser o primeiro conta muito. Kevin Plank sabe disso e espera que algumas das suas mais recentes criações convençam os consumidores.

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