A Talkdesk nasceu em outubro de 2011 e dois meses antes do aniversário, a tecnológica portuguesa comemorou a sua primeira década de vida com uma pujante ronda de investimento, Série D, no valor de 230 milhões de dólares (196 milhões de euros), a terceira, que a catapultou para um estatuto de unicórnio avaliado já em 10 mil milhões de dólares.
Apesar da empresa estar, nesta fase, a reduzir o seu número de colaboradores em todo o mundo de até 200 pessoas de modo a alinhar recursos com as prioridades da empresa e com o contexto económico, o negócio da Talkdesk continua forte, com o crescimento da procura no setor.
A Talkdesk entrou este ano, pela primeira vez, no “top 10” das empresas de Cloud de maior capacidade à escala global, ao figurar na 8ª posição da Cloud 100 da Forbes, com uma avaliação de $10 biliões, cerca de 9,7 mil milhões de euros. Na lista de 2021, a Talkdesk figurava no 17º lugar.
A história da tecnológica confunde-se com a história do seu próprio fundador, um jovem engenheiro com uma pequena e uma grande ambição: ter um computador novo e criar uma empresa. Tiago Paiva, 34 anos, mestre em Computação conta-nos como foi: “Tive a oportunidade de entrar numa hackathon (maratona de programação) quando tinha 24 anos e inscrevi-me porque tinha um portátil antigo e não tinha dinheiro para gastar num novo. Estava determinado a ganhar um MacBook, que era o prémio, e ganhei. Depois disso, o Paul Singh, um parceiro do 500 Startups, convidou-me para me juntar ao terceiro grupo de empresas nas quais estavam a investir, nos Estados Unidos. Tive apenas duas semanas para fazer as malas e mudar-me de Portugal para São Francisco, na Califórnia”.
E foi aqui em terras do Tio Sam que a Talkdesk, empresa de software de contact centres nasceu, apesar do seu ADN português. “Silicon Valley é o epicentro da tecnologia e um terreno fértil para as startups porque permite uma aprendizagem constante e permite fomentar o crescimento das organizações de uma forma totalmente diferenciada”, refere, acrescentando que “estamos integrados. Porém é em Portugal que têm os centros de inovação e desenvolvem parte da tecnologia e onde, também, trabalham 50% dos seus colaboradores, apesar de se assumirem como uma empresa 100% remote friendly. “Temos bastante orgulho nisso e continuaremos a atrair talento português para continuar a ser uma referência e uma boa escola de engenharia a nível nacional”, remata.
Como se cria um unicórnio
E aquilo que parecia um sonho para Tiago Paiva foi-se concretizando, com entusiasmo e know-how: “Por mais difíceis que fossem aqueles dias, eu adorava o que estava a fazer. Adorava as lutas, os negócios ganhos, a recuperação de negócios perdidos, a paixão para transformar algo (na altura) banal, como uma conversa entre uma empresa e um cliente final num momento significativo que iria construir a confiança e a lealdade da marca. Tudo isto me entusiasmou na altura, e ainda me entusiasma agora. E quando enfrentávamos algum contratempo nesses primeiros tempos, não deixávamos que isso nos desencorajasse. Utilizámos essas alturas como momentos de aprendizagem para tornar a Talkdesk melhor e mais forte como empresa”.
Uma empresa com um nome sui generis e que também suscita curiosidade. Afinal, o que esteve port trás desse brainstorming: “Estávamos a criar uma tecnologia baseada na cloud que permitia às pessoas conectarem-se, falarem (talk) umas com as outras. E, quando as pessoas precisam de respostas, o primeiro lugar a que se dirigem é a uma help desk (o balcão de ajuda). O nome Talkdesk é a materialização desta ligação entre os consumidores e clientes com as respostas e pessoas que precisam para resolver as situações, a qualquer hora, em qualquer lugar”.
Uma missão que se transformou numa rápida e eficaz vantagem competitiva para as empresas, um core que ainda hoje se mantém, ajustado aos novos desafios e caminhos traçados. “Vivemos na era digital, onde os consumidores têm mais escolha e controlo na forma como interagem com as marcas do que nunca.
De acordo com a Talkdesk Research, 63% dos consumidores afirmam que uma única experiência negativa de serviço ao cliente terá um impacto negativo na sua fidelidade à marca. Estas tendências salientam a importância de as empresas colocarem o contact center no centro das suas estratégias de Customer Experience. O investimento na transformação digital pode ajudar as empresas a tornar os clientes mais felizes e transformar o contact center, com a transição destes meios de contacto de uma fonte de custos para uma fonte de lucros”. E assim se justificam os1800 clientes espalhados por mais de 75 países em todo o mundo. O grande jump foi dado durante os últimos dois anos, na execução da sua ousada missão de oferecer uma melhor forma de as organizações desbloquearem a promessa e o potencial de uma grande experiência do cliente.
Investimentos
Com o anúncio do fecho da série D de financiamento, em agosto de 2021,, a tecnológica angariou 230 milhões de dólares (cerca de 196 milhões de euros), passando a ser considerada uma das empresas privadas mais valiosas no setor de Software as a Service (SaaS) e na indústria de software. Com esta ronda – que diferiu das restantes por não ter sido solicitada –. a tecnológica continuou a investir em três ângulos: contratar os melhores talentos, apostar fortemente em Investigação e Desenvolvimento e entregar um serviço meticuloso e detalhado aos clientes.
“A Talkdesk foi criada porque eu sabia que havia uma melhor forma de prestar serviço aos clientes – nascemos na cloud, com uma plataforma que proporciona vantagens sem precedentes de velocidade, agilidade, escalabilidade, e fiabilidade – e é isso que estamos a entregar”.
Com novos e estratégicos investidores, embora sem revelar a estrutura acionista da empresa, o CEO explica como se captam estes investimentos, ao todo 425 milhões de euros de financiamento: “É uma espécie de movimento natural: construímos uma empresa, angariamos os primeiros dólares e estes permitem-nos executar novas dinâmicas e chegar ao nível seguinte; depois recebemos mais dinheiro e repetimos o ciclo. Não é algo que decidimos e fazemos de um dia para o outro, são processos demorados e trabalhosos. Em 20 segundos, posso dizer que é assim que funciona, mas existem muitos meses de trabalho árduo pelo meio”.
E no meio deste processo, o facto de ser unicórnio terá o seu peso, inegável, nas palavras de Tiago Paiva, também uma responsabilidade acrescida e “um reconhecimento generalizado enquanto simultaneamente contribuiu para fortalecer a imagem da empresa, posicionando-a como um parceiro a considerar, pelos potenciais clientes, na hora de pensar na estratégia para os contact centers das empresas”.
Porque o futuro passa por aí, por transformar o custo em fontes de lucro e as empresas têm de ter este mindset: “Ao longo da última década, o digital tornou o call center no contact center e trouxe uma panóplia de canais através dos quais os clientes podem procurar apoio, além do telefone: email, redes sociais, mensagens in-app, entre outros. O próximo passo agora é saber encarar todos estes canais de modo holístico e usá-los harmoniosamente para oferecer a melhor experiência de sempre. Desta forma, e considerando as necessidades e expectativas do cliente, o contact center pode transformar-se numa fonte de satisfação para os clientes e, por consequência, de lucro para as empresas”.
Na base de tudo, claro, a inteligência artificial, entendida como uma ameaça para uns, um parceiro para outros. “Nos contact centers esta parceria observa-se, por exemplo, no tempo de análise dos dados uma vez que, com recurso a IA, despende-se uma fração do tempo que os agentes demoram a fazê-lo, libertando-os para se concentrarem em iniciativas de maior valor. Esta questão é também valorativa para os trabalhadores dos contact centers que, através de um trabalho conjunto com os Assistentes Virtuais podem, por um lado, atender os clientes de forma mais personalizada; e por outro, alocar o tempo que despendiam na procura e relacionamento de dados, a atividades de maior valor”.
O cliente tem sempre razão?
“Nós dizemos que somos customer obsessed. A “Era do Cliente” não é uma expressão de agora, e a máxima que lhe está associada – e que sugere, de que “o cliente tem sempre razão” – leva-me para a uma outra questão que é a necessidade de se procurar garantir uma abordagem mais real e honesta no serviço que é prestado. Por muito que se compita ao nível dos preços, a combinação vencedora será, acredito, a junção do tangível – que encontramos nos produtos inovadores que respondem às necessidades dos clientes – com o intangível – que é a vontade de prestar um bom serviço, ouvir o que é procurado, aprender e responder em conformidade”, explica.
Na Talkdesk tal é feito através de advisors focados no consumidor e comunidades online dedicadas pois, “são eles quem nos ajudam a dar forma ao nosso negócio e produto. Só desta forma conseguimos aprender e ir mais além, com eles e por eles”.
Como parte da sua busca para revolucionar o mercado dos centros de contacto e automatizar 80% das interações com os clientes, a Talkdesk também introduziu a primeira ferramenta human-in-the-loop da indústria para contact centers e que consistem no fornecimento de informações e conhecimento, por parte de humanos, para os sistemas de inteligência artificial, de forma continuada. “Desta forma é possível treinar um sofisticado sistema que usa Inteligência Artificial como um algoritmo para tomar decisões autonomamente ou sugerir ações. No entanto, nunca um posto de trabalho é substituído, são sim adaptados e desenvolvidos”.
E porque falamos de recursos humanos, inevitável a abordagem da contratação da primeira CFO num momento que a empresa atingiu um ponto de maturidade que a tornou indispensável: “A Sydney Carey é a candidata perfeita para preencher a função porque traz para a Talkdesk uma vasta experiência financeira e operacional, onde se incluem funções executivas e de membro do conselho de administração em contabilidade, planeamento financeiro, fusões e aquisições, relações com investidores, tesouraria, instalações, compliance e operações de TI/negócios. Ficámos extremamente impressionados com a sua experiência, e ela parece ter a mesma paixão e vontade de sucesso que nós”.
Integrada na cultura organizacional, a sua contratação permitiu também atingir a igualdade do género na equipa executiva. “Acreditamos numa cultura de inovação, criatividade e engenharia caracterizada pelo desafio intelectual constante e por oportunidades de aprendizagem contínua, que espelhamos nos nossos cinco valores: Coragem para Inovar; Obsessão pelo Cliente; Diversidade, Equidade e Inclusão; Confiança e Transparência; e a Solidariedade com a Comunidade e o Meio Ambiente. Como uma extensão dos nossos valores, estabelecemos os Grupos de Recursos dos Colaboradores que permitem aos Talkdeskers envolverem-se a um nível mais profundo e terem um impacto positivo imediato dentro das suas redes, comunidades e do mundo através de atividades de voluntariado”, acrescenta o fundador que não descura uma IPO, mas para já o caminho está traçado: duplicar o negócio no ano fiscal de 2022, aumentar a base de clientes empresariais, investir na expansão internacional com os parceiros, e liderar nas indústrias através da inovação na Experiência do Cliente.
E se se vê, em algum momento, desligado do seu unicórnio, um caminho já percorrido por outros visionários, Tiago Paiva admite: “Sinto uma forte ligação emocional com a Talkdesk e planeio liderar esta empresa durante muitos anos. Vender ou sair não é algo que seja fácil para mim de imaginar, mas quero sempre fazer o que é certo para a Talkdesk. Não posso prever o futuro, mas posso prometer que será a intenção de fazer mais e melhor pela empresa a guiar quaisquer decisões que precisem de ser tomadas, agora e no futuro”.