Avanti Sharma, as novas gerações e a vontade da mudança: “Queremos trabalhar juntos com o mundo adulto”

Com 17 anos, Avanti Sharma já carrega uma bagagem de experiências. Aprendeu programação em criança e cedo percebeu que havia poucas raparigas e mulheres no mundo da tecnologia. Não baixou os braços. Começou também a ensinar mais raparigas na organização sem fins lucrativos Workshop4Me, onde atualmente é especialista em tecnologia e chefe de desenvolvimento de…
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A convite da Women in Tech, Avanti Sharma embaixadora da GirlsInTech Luxemburgo, esteve em Portugal e falámos com ela sobre como a educação e a inclusão são vistas pelas gerações mais novas.
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Com 17 anos, Avanti Sharma já carrega uma bagagem de experiências. Aprendeu programação em criança e cedo percebeu que havia poucas raparigas e mulheres no mundo da tecnologia. Não baixou os braços. Começou também a ensinar mais raparigas na organização sem fins lucrativos Workshop4Me, onde atualmente é especialista em tecnologia e chefe de desenvolvimento de negócios, a participar em competições de programação e a discursar em várias conferências internacionais. Acima de tudo, Avanti segue a luta para eliminar a desigualdade de género na educação (e na tecnologia) e defende a importância da sua geração, tão intrinsecamente ligada à Internet, em deixar um mundo melhor e mais sustentável para o futuro. É também embaixadora da marca GirlsInTech Luxemburgo e esteve na Women in Tech Porto Summit, que se realizou nos dias 31 de maio e 1 de junho, para falar sobre como a educação, a inovação e a inclusão são vistas pelas gerações mais novas.

Crédito das fotografias: Cristina Cavalcante

Quando começou a tua ligação à tecnologia, sobretudo à programação?
Conheci o mundo da programação muito nova, tinha cerca de seis/sete anos. A minha mãe, Madhumalti Sharma,  fundou uma organização sem fins lucrativos no Luxemburgo, a Workshop4Me, que ensina programação a crianças dos cinco aos 16 anos. Nessa altura era muito nova e não sabia o que se passava, mas via as crianças a juntarem-se e a fazerem projectos muito interessantes e criativos e pensava: “Também quero fazer isto”. Sempre fui muito criativa e pensei que a tecnologia também o poderia ser. Houve um momento que me fez continuar, quando percebi que não havia muitas raparigas a fazê-lo, a aprender programação, e pensei: “Isto é estranho. Sinto-me deslocada”. Sempre fui uma rapariga muito “girly”, adoro princesas e todas essas coisas, e quando parei para pensar, percebi que ninguém da minha idade estava a fazer isto. O meu irmão disse-me que não interessava que ninguém o estivesse a fazer, que eu podia fazê-lo. E continuei. Em 2017 tornei-me coach na Workshop4Me, ou seja, comecei a ensinar outras crianças a programar.

Sentiste que poderias fazer alguma diferença ao dar o teu exemplo?
Sim, definitivamente. Pensei: “Se eu me sinto assim, tenho a certeza que há muitas outras raparigas que também se sentem assim”. Senti quase como uma obrigação, porque tive esta oportunidade. Como todo o modelo de funcionamento da Workshop4Me baseia-se em crianças a ensinarem crianças, quando uma criança ensina outra elas identificam-se, são como se fossem amigas, não há qualquer medo ou vergonha. O meu irmão é cinco anos mais velho do que eu e estava mais ocupado com adolescentes da idade dele e, por isso, havia um espaço disponível para uma coach, com oito/nove anos, que podia ensinar os mais novos. Foi aí que me cheguei à frente.

Crédito das fotografias: Cristina Cavalcante

Estando a acompanhar desde nova o uso da tecnologia, como é que olhas para o cenário actualmente? Já há mais inclusão?
Penso que estamos a caminhar para um sítio muito melhor no que diz respeito a três aspetos: educação, inovação e inclusão. A geração mais nova — e isto vai sempre acontecer — vai estar sempre um passo à frente no combate a restrições ou barreiras impostas. Agora que estamos a caminhar em frente, temos de quebrar essas barreiras. E sinto que, neste momento, com a geração Z e a geração Alpha estamos definitivamente a caminhar para um sítio onde não temos tantas barreiras e diferenças entre o que um homem ou uma mulher podem fazer. Elas ainda estão lá e vai demorar alguns anos a eliminá-las, mas acho que estamos a progredir.

Para mim, mesmo que ainda hoje existam disparidades – como o facto de apenas 33% das mulheres trabalharem em empresas tecnológicas atualmente –, à medida que avançamos vai melhorar. Mas também quero alertar para o facto de que a geração mais nova não está a culpar ninguém. Não estamos a culpar o mundo adulto, nós entendemos de onde tudo isto veio, mas queremos ultrapassá-lo. A principal mensagem que quero passar sobre a geração Z é que não queremos culpar ou acusar ninguém das gerações anteriores. Queremos trabalhar juntos com o mundo adulto.

Crédito das fotografias: Cristina Cavalcante

Como é que se consegue equilibrar estes três pilares: educação, inovação e inclusão?
Equilibrar estes três mundos é desafiante. Os dois pilares em que temos de nos focar neste momento são a educação e a inovação. A educação são as skills mais a ética e a inovação é um novo desenvolvimento que melhora o mundo. Assim que a educação e a inovação sejam alcançadas, a inclusão vai automaticamente seguir esse caminho. Se queremos que algo seja ético, vamos ter de entender que vai ter de ser inclusivo e é por isso que digo que os dois pontos fundamentais que devemos abordar nos próximos anos é encontrar a educação, especialmente no ângulo da ética – o que significa questionar, ser curioso, pensar antes de fazer algo – e depois no ângulo da inovação é o desenvolvimento para fazer algo bom para a sociedade.

Sentes que muitas pessoas ainda subestimam o poder e a capacidade das gerações mais novas no que toca à mudança?
Sim, definitivamente. Se eu agora disser para pensarem num adolescente, e podem pesquisar isto, muita gente pensa que são mal educados, rudes e outras coisas, como se não tivessem ambição em fazer alguma coisa. Quero mudar a narrativa e quero mostrar que as novas gerações estão ainda mais dispostas a fazer a diferença no mundo. A geração Z cresceu com a tecnologia. Há tantos novos influencers por aí que criaram um novo mercado de trabalho – pessoas que se estão a tornar nos seus próprios diretores e realizadores. Estão a fazer tudo isto por eles próprios: a editar, a produzir, a escrever guiões, a filmar e ainda são os atores do seu próprio conteúdo. Fazem seis papeis num só e isto mostra uma ambição incrível para as gerações mais novas.

Como é a experiência de ensinar programação a outras crianças? Sentes diferenças ao longo dos anos?
Adoro ensinar programação aos mais novos. Agora que o faço há quase sete anos, vejo uma grande evolução. Em primeiro lugar, é muito satisfatório para mim, mas outra coisa que também vejo diferença: é que agora as crianças são muito mais focadas na eficiência. Antes, apenas queriam focar-se na melhor forma de fazer uma coisa e demoravam mais tempo a fazê-lo. Agora, o principal objetivo mudou e além de pensarem na solução mais eficaz, também pensam na solução mais rápida para resolver uma determinada tarefa.

Crédito das fotografias: Cristina Cavalcante

E há mais raparigas a aprender programação?
Definitivamente. Temos conseguido chamar mais raparigas à programação. Alguns anos depois da fundação da Workshop4Me fizemos um workshop de programação só para raparigas, porque achamos que deveríamos dar-lhes um sítio em que elas sentiam que tinham uma voz. Ficamos muito felizes porque foi um grande sucesso no Luxemburgo. Tivemos as nossas turmas cheias durante muitos anos e agora temos grandes histórias vindas daí – algumas dessas alunas tornaram-se professoras e agora estão a ensinar outras crianças e algumas seguiram programação na universidade. Foi muito recompensador.

Se pudesses dar um conselho às pessoas da tua geração ou mais novos, o que dirias?
Diria para pensarem no que querem fazer e no porquê de o quererem fazer. Eu própria ainda sou uma criança e vejo que muitas vezes nos dizem para fazermos qualquer coisa, mas acho que, nesta fase, essa orientação não é suficiente, porque muitas vezes não sabemos mesmo o que queremos fazer. O meu conselho é que pensem no que gostam e têm interesse e pensem no porquê de o quererem fazer. Qual é a razão por detrás do que queres fazer? Outra coisa que gostaria de dizer é que não trabalhem apenas para obedecer às ordens de outros. Trabalha porque sentes que isso é a coisa certa a fazer. Pensa por ti próprio antes de fazer algo.

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