Clement Roseyro: “Nunca vamos estar totalmente preparados para uma onda de 30 metros”

“Antes deste ano estava mais concentrado em fazer todos os meus desportos, porque para mim era importante estar um pouco por todo o lado. Agora, depois deste evento na Nazaré, sinto que talvez precise de me concentrar mais nas ondas grandes”, disse Clement Roseyro à Forbes em 2024, logo após o seu primeiro TUDOR Nazaré…
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Em apenas um ano, Clement Roseyro passou de um segundo lugar na estreia no Nazaré Big Wave Challenge para a primeira posição a nível individual e por equipas. A Forbes falou com o surfista francês sobre este ano, a competição e a sua carreira.
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“Antes deste ano estava mais concentrado em fazer todos os meus desportos, porque para mim era importante estar um pouco por todo o lado. Agora, depois deste evento na Nazaré, sinto que talvez precise de me concentrar mais nas ondas grandes”, disse Clement Roseyro à Forbes em 2024, logo após o seu primeiro TUDOR Nazaré Big Wave Challenge.

Kitesurf, foiling, surf, surf de ondas grandes. Qualquer que fosse o desporto aquático, se as condições o permitissem, ele estava lá. Foi a Nazaré que mudou tudo. Quando chegou a Portugal para a competição do ano passado, trazia consigo apenas alguns dias de treino ao lado de Nic von Rupp, o seu colega de equipa. Ainda assim, não passou despercebido. No final do dia conseguiu um segundo lugar, perdendo apenas para Lucas Chumbo.

Se neste cenário o resultado foi um segundo lugar, o que é que aconteceria se o foco fossem apenas as ondas grandes e o treino acontecesse ao longo de todo o inverno?

Regresso à Nazaré

“Tomei a decisão de, no final de outubro, ir para a Nazaré e passar lá todo o meu tempo, ir para a água todos os dias, grandes ou pequenos. Nem fui ao Havai este inverno porque queria estar concentrado na Nazaré e não me lesionar noutro sítio”, conta o surfista francês à Forbes.

Muito tempo na água, treino fora da água, como alongamentos e apneia, e muito trabalho a nível mental. No fundo é isto que resume o dia-a-dia de Clement entre outubro e janeiro. “Estava a tentar estar o mais preparado possível”, diz. “Nunca vamos estar totalmente preparados para uma onda de 30 metros, para vermos algo louco à nossa frente, mas grande parte é a preparação a nível psicológico. Faço psicoterapia e estou a fazer algumas coisas de sofrologia para analisar o que vai estar na minha mente quando enfrentar aquelas ondas”.

Há, claro, um outro fator que contribui para a preparação: a experiência. E não falamos apenas daquela que se vai ganhando após algum tempo na Praia do Norte, falamos de todo um percurso – que começa para muitos em criança – em que estes atletas tiveram de aprender a lidar com adversidades.

“Acho que no ano passado não estava, de todo, preparado para competir. Ou estava, mas não como este ano. No ano passado, o maior dia que surfei foi o dia da competição e este ano o maior dia que surfei foi duas semanas antes da competição. Eu estava numa mentalidade completamente diferente entre este ano e o ano passado”, afirma.

Ainda que a Nazaré tenha sido a casa de Clement ao longo de todo o inverno, o surfista acabou por fazer algumas viagens em busca de outras ondas, como é, aliás, a rotina normal de um surfista de ondas grandes. Uma dessas viagens foi a Belharra, em França, onde apanhou o swell que, mais tarde, chegaria à Nazaré como o maior desta temporada. Foi nesse momento, já em Portugal, que tomou uma das decisões mais difíceis para estes atletas.

“Eu já estava feliz, não queria forçar muito. Naquele dia, na Nazaré, foi bastante assustador”, diz. E é aqui que a experiência pesa, seja porque ainda não se passou por todos os passos necessários para arriscar ondas que podem chegar aos 30 metros, ou para se ter plena consciência disso mesmo. “É preciso treinar em ondas de 10 metros, depois em 15 metros, 20 metros, 25 metros, antes de passar de uma onda de 15 metros para uma de 30 metros. Era um passo demasiado grande. Optei por não surfar, foi uma escolha difícil para mim”, afirma. Ainda assim, nesse dia o surfista foi para a água de mota de água ao lado de Nic von Rupp.

Luz verde

Já quando o Nazaré Big Wave Challenge chegou, Clement Roseyro estava pronto para segurar a corda. Este ano com muitas atenções viradas para si. Depois de aparecer no ano passado, um nome desconhecido para alguns, e desafiar Lucas Chumbo, um dos nomes mais populares da modalidade, na luta pelo primeiro lugar, a expetativa aumentou para o ano seguinte. E como se não bastasse, a poucos dias da competição de 2025 o surfista foi anunciado como o novo embaixador da TUDOR, a marca que dá nome ao evento.

“A expetativa era maior, mas não senti mais pressão. Para mim era mais: talvez pensem que no ano passado tive sorte, este ano só preciso de garantir que a minha performance do ano passado não foi um acaso, foi porque eu trabalhei para isso”, diz.

A antecipação para o dia do evento começou cerca de um mês e meio antes do dia do campeonato, quando se soube que Chumbo se tinha lesionado e ia passar por uma cirurgia. Clement recorda as mensagens que recebeu logo em seguida sobre a possibilidade de, com a ausência do brasileiro, este ser o seu ano. Mas, claramente, não era assim que queria ganhar.

“Talvez vença, mas por ele não estar cá é uma situação estranha”, pensou na altura. “Com sorte, ele voltou mais forte e como a competição aconteceu mais tarde ele teve tempo para recuperar e competir. Com as emoções à flor da pele pensei: Estou preparado, nunca estive tão preparado para a competição. Ele vai dar o seu melhor, eu vou dar o meu melhor, mas, enquanto equipa, estamos mais preparados do que ele”.

E venceu. No final do dia, Clement Roseyro levou o prémio de melhor performance masculina, Justine Dupont, que ficou no segundo lugar entre todos os surfistas da competição, venceu a melhor performance feminina e a nível de equipas o troféu foi entregue a Clement e Nic von Rupp.

A verdadeira pressão vai chegar no próximo inverno: “Porque temos o título e precisamos de o manter”, afirma.

“Quero ser o melhor nas ondas grandes”

“A onda grande é algo que é uma loucura para nós, acho que é a adrenalina que tínhamos quando éramos miúdos e começámos a surfar ondas maiores. Queremos sempre mais e mais e mais”, conta.

Os pais contam que a paixão pela água já estava lá quando era criança, mas as memórias de Clement começam nas idas ao mar ou à piscina para nadar. Até que aos oito anos começou a surfar. “A minha mente era diferente, queria passar tempo na água e nas ondas. O surf não era uma obrigação, eu queria mesmo estar na água”, lembra.

Só que nada disto anula o medo. Clement Roseyro é surfista de ondas grandes, mas se o mar estiver pequeno ele não deixa de apanhar ondas mais pequenas. Se as condições o permitirem ele aposta no kitesurf, mas há dias em que opta pelo foiling. As opções suficientes para que todos os dias sejam dia de ir ao mar. Por mais que este não seja o dia a dia de qualquer pessoa, na hora de enfrentar uma onda maior do que a anterior o ser humano é sempre um ser humano.

“Quando era miúdo tinha medo do oceano e pensava: este oceano é mais forte do que eu. Demorei algum tempo a treinar e a estar mentalmente preparado para ver uma onda de 2 metros. O pior foi quando vi a primeira onda que estava por cima da minha cabeça, aí fiquei muito assustado”, conta.

A mesma criança que já teve medo de uma onda de 2 metros, é hoje o adulto consciente de que uma onda de 30 metros na Nazaré exige ainda mais preparação. Mas o objetivo é claro e, por isso, poucas duvidas restam sobre se conseguirá ou não superar este seguinte obstáculo.

“Eu quero esforçar-me muito nas ondas grandes, quero ser o melhor nesta disciplina. Quero ganhar e dedicar muito tempo às ondas grandes, a procurar novas ondas. Os outros desportos ainda são uma paixão e quando as condições forem boas vou fazê-los, mas acho que são para mais tarde, daqui a uns anos. A minha vantagem na água é que eu consigo fazer tudo e ser simplesmente feliz”, conclui.

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