A Guerra das Tarifas. Donald Trump está há apenas dois meses na Casa Branca e já inaugurou uma nova era da economia mundial, com uma marcada ofensiva comercial sem precedentes a que muitos já chamam de guerra das tarifas.
As novas políticas do governo norte-americano, de praticar tarifas de importação de vários países, estão a gerar incerteza na economia mundial e a baralhar as previsões de crescimento de muitos mercados. Disso ninguém parece ter dúvidas. Donald Trump sustentou esta ofensiva comercial no facto de que os Estados Unidos estavam a ser injustiçados e penalizados, comercialmente, pelo resto do mundo. Esta é uma táctica que já tinha usado no primeiro mandato para conseguir vantagens negociais com o exterior, sobretudo com a China, mas agora está a alargar a sua ofensiva a praticamente todos os territórios. Começou pelo Canadá, México e China, os seus três maiores parceiros comerciais, e alargou a sua ameaça de mais tarifas à União Europeia. Todos os blocos anunciaram medidas de retaliação. Contudo, será que é vantajosa esta disputa comercial para o próprio país?
“Cada dia uma nova taxa é imposta ou é retirado um imposto anunciado”, disse esta semana o vice presidente do BCE. Adiantou ainda que uma guerra comercial é uma situação em que todos perdem, já que atrasa o crescimento económico, penalizando os mercados acionistas.
Esta semana Luís de Guindos, vice-presidente do Banco Central Europeu (BCE), deu uma entrevista ao Sunday Times em que defendeu que esta guerra comercial está a gerar mais incerteza nos mercados do que a crise provocada pela pandemia de Covid 19. “Cada dia uma nova taxa é imposta ou é retirado um imposto anunciado”, disse o antigo ministro da economia de Espanha ao jornal britânico. Adiantou ainda que uma guerra comercial é uma situação em que todos perdem, já que atrasa o crescimento económico, penalizando os mercados acionistas.
Certo é que a própria Tesla, empresa de Elon Musk, acérrimo defensor das políticas de Trump, está a ser fortemente penalizada pelas declarações do seu fundador, que pretende enfrentar o mundo ao lado do novo líder norte-americano. Perdeu em bolsa cerca de 800 mil milhões de dólares (cerca de 735 mil milhões de euros) do seu valor, e arrastou para baixo a fortuna de Elon Musk.
Mercados perdem mais valor agora ou na pandemia?
Porém, a dúvida persiste: estarão mesmo os mercados a perder valor com as políticas comerciais dos Estados Unidos? Os analistas da plataforma de investimento online XTB foram analisar a situação, pegando, para isso, na evolução dos três dos principais índices mundiais, o Down Jones, o S&P500 e Nasdaq100, entre fevereiro e abril de 2020, altura em que a covid-19 foi declarada como pandemia pela Organização Mundial de Saúde, e os primeiros dois meses do novo mandato de Donald Trump.
Assim, olhando para os valores correspondentes ao período de 2020, é visível que o impacto da pandemia foi bastante significativo, com os principais índices a atingirem quebras superiores a 35%. Assim, feita a mesma análise para os primeiros dois meses de políticas comerciais adversas por parte da administração de Trump, é perceptível que, embora a evolução seja negativa, o impacto não é tão significativo para os mercados financeiros como foi a pandemia. “O Nasdaq100 é o único índice que chegou a registar uma desvalorização superior a 10%, tendo, entretanto, recuperado até ao início desta semana”, pode ler-se no research produzido pela equipa da XTB.
No caso da Europa, os principais índices acionistas europeus estão a aproximar-se de máximos históricos, ao contrário do que aconteceu na pandemia de covid 19.
Porém, a plataforma avança algumas explicações para que este efeito seja mais contido: aplicação das tarifas está a ser apontada como um dos principais fatores de incerteza, mas com elas estão a ser aplicadas outras medidas, como a redução dos custos do Estado e a descida dos encargos com a dívida pública dos Estados Unidos.
Ora, estas medidas estão a conduzir a uma queda do dólar americano, logo contribui para uma queda dos preços dos produtos americanos, o que pode atenuar as tarifas de retaliação implementadas pelos países visados. Além disso, um dos seus objetivos é reduzir os impostos das empresas sediadas nos Estados Unidos, o que por sua vez leva também a uma descida dos preços dos produtos norte-americanos. Esta descida pode conduzir a um aumento do investimento estrangeiro nos Estados Unidos, para contornar a questão das tarifas. Ou seja, o país pode tornar-se mais competitivo, do ponto de vista comercial, diz a XTB.
No caso da Europa, os principais índices acionistas europeus estão a aproximar-se de máximos históricos, ao contrário do que aconteceu na pandemia de covid 19. Isto porque o programa de rearmamento da Comissão Europeia – apresentado sobretudo para combater as criticas de Donald Trump das fracas contribuições para a NATO – está a abrir novas possibilidades às empresas do setor da defesa.
Bolsa europeia animada com perspectivas de crescimento do setor da defesa, mas o risco de aumento dos défices orçamentais é grande e pode aumentar inflação e desacelerar a econ0omia.
Já para a Europa, a principal oportunidade passa pelo reforço do setor da defesa. Depois de sucessivas críticas à contribuição da União Europeia para a defesa da NATO, a Comissão Europeia anunciou um pacote de incentivos à indústria europeia para estimular o rearmamento. Esta decisão não só vai promover a produção industrial já existente, como pode conduzir a incentivos para a produção de componentes atualmente comprados aos EUA, por forma a reduzir a dependência da União Europeia face a outros países. Porém, agrava riscos de défices orçamentais de vários países europeus e de aumento de inflação, condicionando a recuperação económica europeia. “Este cenário poderá comprometer as previsões do BCE, que aponta para uma desaceleração da inflação de 2% da zona euro até ao final do ano ou início de 2026”, afirma o relatório.