A Forbes esteve à conversa com Clemente Rosado e Pedro d’Orey, sócios da QuartoSala, uma referência em Portugal quando falamos em design de interiores – dos projetos à curadoria de marcas. Com três lojas, duas no Príncipe Real e uma em Paço de Arcos, e uma equipa de 35 pessoas e muitos projetos em mãos, a empresa não para de crescer. Este ano preparam a abertura de uma quarta loja: a flagship da Minotti, no Largo de São Carlos, no Chiado, em maio deste ano. A QuartoSala prevê um crescimento exponencial em 2023.
Conhecida por ser um ponto de referência do design em Portugal, os espaços da QuartoSala tem uma espécie de “informalidade” na filosofia e exposição dos produtos das várias marcas que aqui vendem. De onde vem esta vossa abordagem mais ‘revolucionária’, laid-back e proactiva de lidar com o público?
Pedro d’Orey (PD): Sim, sempre quisemos criar uma relação ‘informal’ com o nosso cliente e, de facto, a ideia que levou à criação da QuartoSala foi a de “desformalizar” este negócio de design de interiores. É importante sublinhar que houve um salto muito grande em Portugal – do século XIX, para o design pós-guerra do século XX nesta área. Podemos dizer que fomos revolucionários nesse sentido.
Clemente Rosado (CR): Houve uma lacuna, por assim dizer. Aqui há duas gerações atrás, não se falava de design em Portugal, nem havia cá muita história nem ‘cultura’ do design.
PD: E nós não queríamos só vender só um produto – a ideia era vender serviços, e é isso que fazemos ainda hoje: damos ao cliente uma consultoria, um acompanhamento, um serviço muito próximo e especializado, que acaba por nos caracterizar.
CR: Sim, e esta informalidade e filosofia mais laid-back, foi, também, uma forma de democratizar, por assim dizer, os nossos serviços. Muitas pessoas achavam que não tinham dinheiro para nos contratar, que não tinham orçamento. Mas a existência de serviços mais pontuais, na altura, permitia criarmos outras soluções. Estamos a falar de 1995, quando tudo começou.

E como começaram então? Como é que os clientes vos encontravam, de início?
PD: Nós tínhamos uma carrinha, com um número que começava por 808 (os chamados ‘números verdes’), e os telefonemas eram redirecionados para um call center. Tínhamos oito carrinhas, que circulavam por Lisboa, a dizer algo do género “ligue agora e vamos a sua casa”. Isto era o que tínhamos entre 1996 e 2001. Foi assim que começámos.
CR: E essas carrinhas foram muito marcantes. Em 2001 deixaram de circular pela cidade, mas até há três ou quatro anos atrás, ainda tínhamos clientes que ligavam a dizer que tinham visto umas das nossas vans. Não as viam com certeza – imaginamos que devem ter anotado o nosso número há anos.
Entre 1996 e 2001, o vosso marketing era, portanto, publicidade que circulava. Até porque nessa altura a Internet era ainda uma novidade emergente e experimental.
PD: Sim, e ir a casa dos nossos clientes era uma autêntica blind date. Sem Internet, ao princípio, nós íamos a casa das pessoas e sabíamos muito pouco.
CR: Os clientes não nos podiam enviar fotografias das casas. A revolução digital veio agilizar todo este processo.
Houve, portanto, e ainda há, uma necessidade de conseguir ‘diagnosticar’ o cliente. Mas também a de ajustar a vossa estratégia ao contexto social da altura.
PD: Houve, claro. Das coisas mais importantes para nós foi e é, de facto, saber diagnosticar os nossos clientes. Na prática, se não fizermos bem o diagnóstico, nada acontece. O que interessa, seja por telefone ou em pessoa, é saber o que cliente procura, as suas referências, o budget, tudo. E isso faz tudo parte de uma dimensão para nós muito importante: a comunicação com o cliente. Tivemos de descobrir ‘o gancho’ deste negócio, e pelos briefings acabávamos por lá chegar. A comunicação foi e continua a ser essencial para a QuartoSala.
Ainda hoje em dia, a comunicação é importantíssima.
CR: Em 2001, houve um ponto de viragem muito importante para nós também, no que toca ao ajuste da nossa estratégia.
PD: Sim, fizemos uma pesquisa de mercado e percebemos que ir a casa das pessoas, com as nossas carrinhas e mostruários, desvalorizava os nossos serviços. Começámos a transformar o negócio para um formato menos informal, mas mantendo o apoio técnico – que passou a ter uma apresentação diferente. Tivemos de nos adaptar ao nosso mercado. A nossa ideia, adaptada de um projeto norte-americana, não fazia sentido aqui.

E com esta mudança de estratégia, decidiram também ir para o Brasil, e depois voltar e abrir a vossa primeira loja física?
PD: Em 2006 percebemos que era importante e ‘materializar’ a nossa marca e ter um espaço físico. Começámos com um showroom em Paço de Arcos e começámos a expor peças. Depois, em 2010-2011, com a crise do imobiliário, sentimos que tínhamos de mudar de estratégia rapidamente. Fomos para o Brasil três anos e aprendemos imenso sobre o mercado. Foi uma montanha russa autêntica para nós, era tudo diferente e aprendemos muito.
CR: Os nossos clientes no Brasil queriam marcas e designers específicos.
PD: Ainda temos a nossa empresa no Brasil, que responde a trabalhos pontuais. O nosso forte agora é outra vez o mercado português. Em 2014, também percebemos que os nossos clientes brasileiros estavam a vir para cá.
Tivemos de responder a este ‘novo Portugal’ muito depressa.
Em 2014 tiveram, então, outra mudança de estratégia, em que juntaram aquilo que aprenderam com o mercado Brasileiro com o que já sabiam sobre o mercado português. Voltar a Portugal foi voltar a um mundo diferente?
PD: Portugal tinha mudado, e estava a mudar muito visivelmente. O serviço ficou diferente. Se um cliente nos dizia que se ia mudar para cá em Maio, por exemplo, tínhamos de adaptar a nossa agenda de maneira a conseguir cumprir o prazo estabelecido. Tivemos de responder a este ‘novo Portugal’ muito depressa.
CR: Os nossos clientes brasileiros que queriam vir para Portugal também tinham outra particularidade: traziam com eles os arquitetos com quem queriam trabalhar. O que é, em si, interessante. Não queriam procurar arquitetos locais – preferiam pessoas que os conhecessem e a quem não tinham de explicar muita coisa: por regra, o arquiteto já sabia tudo sobre os clientes. Estabelecia-se com rapidez uma ligação muito forte e pessoal entre o cliente comprador e o arquiteto. Isto também foi novo para nós.
PD: Estes novos clientes obrigaram-nos também a ter um portfólio de marcas, e a saber sempre que marcas é que ‘ressoam’ na cabeça deles. Mas ter lojas físicas ficou claro que era, para nós, o próximo step. Os clientes queriam ver os produtos e não comprar tudo por catálogo.

Ou seja, num mundo cada vez mais digital, acabaram por ‘fazer as coisas ao contrário’. De um marketing de rua, a ter uma página online, a abrirem o vosso primeiro espaço físico.
PD: Fizemos tudo ao contrário! Fomos a primeira loja de design, em Portugal, com página na Internet, em 1998.
Fomos a primeira loja de design, em Portugal, com página na internet, 1998.
CR: Em 2014, telefonemas e internet não era o suficiente. A sofisticação do nosso serviço teve de mudar.
PD: Tínhamos de ter displays. Ter uma empresa que pudessem vir visitar. Queríamos oferecer aos clientes uma experiência também. E isso só acontece em lojas, e não por catálogo. A experiência vale muito.
Será por isso que se distinguem dos vossos concorrentes? Por terem feito as coisas de uma maneira diferente, mais fluida?
PD: Certamente. Os nossos concorrentes, quase todos, acabaram com as lojas físicas depois da crise, e passaram quase tudo para o mundo virtual, com sites, e social media. Ficou tudo online. As lojas ficaram mais pequenas também. Mas nós percebemos que era altura de fazer, de agir, ‘ao contrário’. E foi essa a razão porque crescemos tanto. Em 2014, faturámos €750 mil euros; em 2022, €9 milhões de euros. Demos um salto gigantesco numa altura em que a concorrência fazia o oposto. Claro que hoje em dia já mudaram as coisas, mas foi um tiro no escuro. Tivemos de auscultar o mercado. Acho que também é de sublinhar que temos uma grande preocupação em estar próximos do público. Estamos sempre nas lojas, sempre perto dos clientes, sempre a falar e interagir com eles. Isso dá-nos confiança quando assumimos riscos com a nossa empresa.
Em 2014, faturámos €750 mil euros; em 2022, fizemos €9 milhões de euros.
As experiências que criam, em loja, também refletem isso?
PD: Em loja criamos experiências que envolvem o cliente num mundo diferente. Os nossos espaços têm divisões – num canto temos uma marca, e noutro canto outra -, mas elas falam entre si. É uma divisão seamless. Sofisticamos a experiência, de forma criativa, para o consumidor. Isto é algo que as marcas com quem trabalhamos veem com muito bons olhos. Os clientes sabem que conseguimos criar-lhes experiências sem ‘adulterar’ os conceitos deles.
CR: Temos conseguido encontrar sempre um meio-termo entre o que as marcas querem e o que nós achamos interessante. Um caso obvio é o da Minotti. Trata-se de uma marca rigorosa, e fomos nós que lhes apresentámos uma ideia, e uma proposta, de como queríamos expor as coleções deles. A resposta deles foi superpositiva.

Como é que nasceu essa relação com a Minotti?
CR: A nossa relação com a Minotti começou em 2019. É das marcas mais recentes que temos connosco, e das que cresceu mais rapidamente. Quando abrimos a loja da Rua d’O Século, a Minotti não nos conhecia muito bem, mas tínhamos boas referências de outras marcas e quiseram estar connosco.
PD: Em dois anos, ficamos os melhores clientes da Poliform, B&B Italia, Minotti. Estamos muito bem formados nesta área e estamos por dentro do mercado. Acho que para nós é fácil promover marcas. Temos estruturas e rotinas organizacionais criadas e pensadas para o fazer.
CR: Comunicámos sempre muito bem. Tivemos de aprender a comunicar desde cedo, porque não tínhamos muito espaço comercial ao início, e porque todas as marcas ‘conhecidas’ estavam tomadas por outros. Muitas lojas tinham exclusividade com certas marcas também. Com a crise do imobiliário isso acabou um pouco, e nós percebemos que a comunicação era o nosso forte – e o facto de sermos tão proativos.
PD: Num mundo cada vez mais digital – com NFTs e Bitcoins – não só ficamos mais ‘materiais’ com a criação de lojas e espaços para os nossos clientes, como, ainda, estamos ligados aos nossos clientes online. No instagram temos cerca de 47 mil seguidores, e tudo isto se deve à forte comunicação que mantemos com os nossos clientes. Formámos uma comunidade. E ser referenciais é o nosso objetivo. Vamos sempre ter negócio se formos a referência.
No Instagram temos cerca de 47 mil seguidores, e tudo se deve à intensa comunicação que temos com os nossos clientes.
CR: O nosso trabalho com a Minotti começou por aí também. Eles queriam abrir, como quase todas as marcas, uma flagship store em Portugal. E nós tínhamos, em 2019 e 2020, superado todas as expectativas da marca. Ficou claro, para a Minotti, que era uma parceria que fazia sentido. A localização da nova loja foi também crucial, por ser uma prime location. A loja vai abrir no Largo de São Carlos, no Chiado, e está prevista a inauguração para Maio.

Ficou claro à Minotti que não fazia sentido avançar com outros que não nós.
PD: Foi um projeto muito bem planeado, com muito rigor, num bairro histórico.
CR: E novamente surpreendemos a Minotti. Enviámos-lhes um projeto já feito. Eles estavam habituados a ser eles próprios a fazer o projeto para as flagship deles, como faz sentido. Mas nós enviamos as nossas ideias, e eles adoraram. Fizeram poucos ajustes ao projeto que enviamos.
PD: Hoje em dia as marcas dividem-se um pouco ‘em três’, em Portugal – Norte, Centro, e Sul – e nós ficamos com a exclusividade em Lisboa (Centro).
Conselhos para outros empreendedores?
PD: Não serem tão ‘tradicionais’. Em plena crise li um livro, intitulado ‘Rework’, escrito por Jason Fried e David Heinemeier Hansson, que mudou também a nossa perspetiva. Nós começamos com um business angel, e tínhamos targets, estávamos focados em gestão comercial – era tudo muito pré-formatado. Queríamos 56 agentes da QuartoSala entre Portugal e Espanha e, ao fim de 10 anos nisto, li o tal livro. Era algo genial, um texto que sugere não nos focarmos tanto nos números.
A QuartoSala é um serviço de Projetos de Decoração e Design de Interiores, com um atelier de arquitetura in house. Trabalha com marcas de design internacional de topo, entre elas, a B&B Italia, Baxter, Cassina, Edra, Flexform, Flos, Knoll, Man of Parts, Maxalto, Minotti, Poliform, Zanotta, e uma curadoria de designers brasileiros, onde se destacam Sergio Rodrigues e Jader Almeida.

Dados importantes
Quem são: Clemente Rosado e Pedro d’Orey
Onde estão: Príncipe Real, Rua de O Século 171 | Príncipe Real, Rua da Escola Politécnica 42| Paço de Arcos, Praceta José Epifânio de Abreu 4
Contactos: +351 214 411 110 | atendimento@quartosala.com
Horários: 2ª a 6ª das 10h00 às 19h00 | Sábado das 10h00 às 18h00
Website: www.quartosala.com
Instagram: @quartosala