Há 14 anos, as redes sociais eram – no mínimo – menos complexas do que aquilo que são hoje. Os anúncios não surgiam em todo o lado, a edição das fotografias passava apenas pelos filtros incluídos nas aplicações, o conceito de influenciador digital não existia e os planos de dados limitavam muito mais o uso das plataformas.
14 anos depois, o relatório semanal do tempo de ecrã dos smartphones assusta muita gente: As estatísticas do perfil de cada um permitem que a influência se tenha tornado uma profissão e há até eleições e guerras a serem influenciadas por aquilo que é partilhado nas redes sociais.
Em 2010, o número de utilizadores nas redes sociais era inferior a mil milhões. Hoje, só o Instagram – criado nesse mesmo ano – soma mais de 2,4 mil milhões de utilizadores ativos. Esta é a terceira rede social com mais subscritores em todo o mundo, logo atrás do Facebook (cerca de 3 mil milhões) e do Youtube (cerca de 2,5 mil milhões).

Pelo caminho, a Forbes norte-americana notou a tendência. Em 2017, lançou a sua primeira lista ‘Top Influencers’ a nível global. Na altura eram nomes como Zoella (Beleza), Kayla Itsines (Fitness) e Grace Bonney (Casa) que a lideravam. A Forbes Portugal seguiu o mesmo caminho: Primeiro com a lista dos youtubers mais influentes do país e depois com os instagrammers. Foi na segunda lista, lançada em 2019, que conhecemos em detalhe a segunda profissão de Rita Pereira, na altura líder do ranking, com um nível de influência de 8,16.
Cinco anos depois, a Forbes Portugal voltou a falar com a atriz e influenciadora digital. E foi com ela que tentámos perceber a evolução da profissão que veio mudar a forma como usamos as redes sociais.
O que dizem os números?
Em 2019, foi através do vídeo que publicou a anunciar a sua primeira gravidez que ficámos a perceber o alcance de Rita no Instagram. Publicado a 3 de setembro de 2018, o vídeo contou com cerca de 2 milhões de reproduções, 197 mil gostos, 9 mil comentários e 1 milhão de contas alcançadas. A 21 de junho de 2024, anunciou a sua segunda gravidez – desta vez de uma menina – e os números confirmam o crescimento do seu alcance: 3,4 milhões de reproduções, mais de 200 mil gostos, 7 mil comentários (o único número que diminuiu) e 1,1 milhões de contas alcançadas (49,5% seus seguidores e 50,5% não seguidores).
“Acho que o vídeo foi muito mais falado, a repercussão foi muito maior e o amor que as pessoas me entregaram também foi ainda maior. Também tem a ver com o facto de o Lonô [o filho] estar presente no vídeo, porque sei que é uma criança muito adorada pelos portugueses, muito acarinhada, eu vejo muito isso na rua”, explica Rita, que conta agora com 1,5 milhões de seguidores no Instagram, 1,5 milhões no Facebook e 607,4 mil no TikTok.
A categoria família continua a ser bastante forte nas redes sociais, algo que se tem verificado em qualquer um dos anos da história das plataformas.
Este crescimento refletiu-se também nos rendimentos. Se há cinco anos Rita apontava uma percentagem de 50% dos seus rendimentos ao digital, hoje em dia esse valor chega aos 80%. “Aumentou bastante, sim. Não quer dizer que os rendimentos enquanto atriz tenham diminuído, mas significa que os rendimentos no digital cresceram bastante. Obviamente que varia muito quando estou a fazer um projeto, porque tenho um contrato e é sabido que ganho mais quando estou no ativo. Agora que eu não estou no ativo, posso dizer à vontade que uns 80% vêm do digital”, conta.

Os 5 mil euros que cobrava por publicação também já não são uma realidade, uma vez que o valor aumentou à medida que a capacidade de investimento das marcas e a quantidade de pessoas que seguem Rita Pereira também foi subindo. Recorde-se que, há cinco anos, Rita tinha cerca de 1,2 milhões de seguidores. A atriz não mencionou o valor que cobra por publicação atualmente, mas esclareceu que é difícil ter um preço de tabela nas redes sociais.
“Este cliente comprou 10 conteúdos. O valor de cada conteúdo para ele não é o mesmo que para um cliente que só comprou um conteúdo. Portanto, tudo é adaptável. O meu valor base não baixa, mas adapta-se ao número de conteúdos que a marca compra. Um influenciador não deixa de ser uma pessoa com uma carreira, como é que tu vais colocar numa tabela um ator que já teve este percurso com um ator que acabou de começar, por exemplo?”, questiona.
“Procuram o Instagram em primeiro lugar”
Apesar de não ser a rede social com mais utilizadores, o Instagram continua a justificar o investimento de mil milhões de dólares da parte da Meta, em 2012. Ainda 2024 não acabou e só este ano o número de pessoas na plataforma já passou dos 2,1 mil milhões de utilizadores para os 2,4 mil milhões. No trabalho de Rita como influenciadora digital, é sem dúvida esta a aplicação mais importante. Além de ser aquela com que se identifica mais.
Mas há uma outra que, principalmente desde a pandemia causada pela covid-19, está a ganhar bastante terreno. O TikTok, que nasceu em 2016, conta já com mais de mil milhões de utilizadores em todo o mundo. “Gosto de ver, gosto bastante. O TikTok mudou muito nos últimos anos, já não é só as danças, já há muita coisa que acabo por descobrir no TikTok e que às vezes passo para o Instagram”, diz Rita, acrescentando que já começa a ser reconhecida por ter TikTok. “Não viram os Morangos, não têm idade”, brinca.
A nível profissional, este cenário também é confirmado pelas marcas. “Procuram o Instagram em primeiro lugar e depois acrescentam o TikTok caso a marca se identifique com essa rede social. Por norma é assim”, explica Rita em relação às propostas que lhe chegam.
O trabalho com as marcas, no caso de Rita, pode ser definido em três palavras: Longevidade, liberdade e criatividade.
A atriz faz trabalhos pontuais com algumas marcas, mas gosta bastante de manter a parceria por mais tempo. Como é o caso da Oriflame, L’Oréal, Prozis ou do Continente, com quem já trabalhava em 2019 e continua a trabalhar até hoje. A estas e a qualquer outra marca, Rita não aceita um briefing com a qual não se identifique. “Não verás nenhum conteúdo no meu Instagram que digas: Isto foi mesmo só o cliente que quis, foi escolhido a 100% por ele. Eu formei-me em comunicação e publicidade para ser copywriter, na verdade é exatamente isso que hoje sou nas minhas redes”, diz, realçando que as redes sociais levaram a uma mudança na forma como as marcas lidam com os seus embaixadores: “A marca procura-te porque se identifica contigo. Há 20 anos, quando comecei, a marca gostava de ti, mas tu tinhas de ser a marca, hoje a marca vai à tua procura para ser um pouco tu”.
É através deste entendimento entre o que a marca quer e a forma como o influenciador passa a mensagem que o consumidor vai – ou não – seguir a sugestão. Rita acredita que quando o consumidor entende a verdade, a estratégia resulta.
“Eu acho que a única coisa que vai continuar a vender vai ser sempre a verdade. Nós todos os dias somos engolidos por marcas, não há uma vez que tu abras as tuas redes e não passe por ti uma marca ou alguém a tentar vender-te o que quer que seja. O que é que te leva a escolher comprar este produto e não este? Eu acho que é a verdade com que a pessoa te passa aquela mensagem”, defende Rita.

Em nome próprio
Rita Pereira não se limita a trabalhar com as marcas dos outros. Ao longo da sua carreira, foi mostrando um lado empreendedor. Atualmente tem duas empresas em nome próprio, uma que partilha com a irmã e a outra onde está sozinha, e trabalha com a Fusion, uma marca de roupa portuguesa em que os rendimentos são divididos por igual. O seu projeto mais recente é uma marca de roupa de criança: Hyndia.
“Eu gosto de roupa e sempre quis alguma coisa com a qual eu me identificasse, que fosse simples para mim, prático. Quando o Lonô nasceu, as pessoas diziam-me muitas vezes ‘adoro a roupa do Lonô, onde é que compraste?’. E eu pensei, em vez de estar sempre a dizer de onde é, posso dizer que é meu. Então surgiu essa ideia de criar os fatos de treino”, explica. A marca continua a vender, mas não lançou novos modelos nos últimos meses, enquanto Rita esteve a trabalhar no Brasil. “Mas agora vou voltar outra vez ao ativo”, diz.
Na Hyndia, uma marca Made in Portugal, Rita é a responsável por todos os desenhos. E apesar de não ser ela que está diariamente na página do Instagram da insígnia, garante que tudo passe por si antes de ser publicado. “Tenho uma pessoa a trabalhar comigo, mas ela não pode publicar nada, nem responder a nada que não passe por mim. Tenho dificuldade em delegar a 100%”, afirma.
Um dos seus negócios que mais se associa à atriz é a Beiju Tapiocaria, que Rita vendeu, entretanto. “Vendemos a empresa já implementada. A Beiju continua no ativo, felizmente. Eu não conseguia gerir 12 restaurantes, a minha carreira e as redes sociais. Estava a ser um bocadinho complicado porque realmente a restauração é um dos campos mais difíceis de se trabalhar e tiro o chapéu a todas as pessoas que trabalham em restauração, tem mesmo de se estar presente. E aprendi isso. Aprendi e preferi vender enquanto estava no auge”, conta.
Profissão: Atriz
E se tudo isto acabasse amanhã?
“Para mim, não seria um problema. Se a minha conta no banco diminuiria, com certeza, mas a minha carreira ia continuar feliz”, diz.
Assim como continuou nos últimos cinco anos, com projetos como “Quero é Viver”, “Dança com as Estrelas” e a série brasileira “Dona Beja”, da HBO. Este último trabalho, ainda por estrear, foi o concretizar de um dos maiores sonhos de Rita a nível profissional. “Foi uma aprendizagem mesmo muito grande a nível pessoal. De repente, voltar à estaca zero, não ser a Rita Pereira com a carreira que tenho aqui há 20 anos, ninguém saber quem eu sou, tanto a nível profissional como a nível pessoal, viver seis meses sozinha sem família e sem amigos por perto. Foi tudo uma grande aprendizagem, mudei bastante e foi muito positivo para mim”, conta.

Depois de 20 anos a ser conhecida do público em Portugal, Rita entrou num novo mercado e voltou a começar do zero. O impacto de fazer um trabalho no Brasil nas redes sociais ainda não foi sentido, uma vez que o projeto ainda não estreou, mas o país é um dos mais fortes nas redes.
“Fez-me olhar para a fama de outra forma, que é muito como o Herman diz: Vais a Badajoz e já ninguém te conhece. Eu sempre tive essa consciência. Ali eu vivi seis meses assim e é diferente, mas foi muito positivo. Não é que eu não goste de ser abordada, eu gosto e vivo muito bem com a abordagem das pessoas, mas vivi perfeitamente a situação da não-popularidade enquanto estive estes seis meses no Brasil. Fez-me observar os outros, os famosos. Fez-me olhar para eles e perceber: Será que eu faço isto? Será que eu vivo desta forma? Fez-me olhar para mim interiormente através dos outros”, diz.
A passagem pelo Brasil deu-lhe também um outro ponto de vista em relação à forma como a cultura é vista e tratada deste lado do oceano. “Comparando com o que vi no Brasil, a cultura portuguesa precisa de muito mais apoio”, diz. Uma das soluções pode passar exatamente pelo alcance que os influenciadores têm nas redes. “Eu acho que se a cultura fosse muito mais falada, muito mais publicitada e consumida por todos, estaria mais perto do que é no Brasil a nível de apoios do Estado. Acho sinceramente que o Estado, ao ver que há um apoio mediático e das redes, olhará para aquilo que oferece aos atores e aos artistas todos de outra forma. Porque, infelizmente, também é assim que funciona”, acrescenta.
E é por cá que Rita espera conseguir fazer uma série em breve, o próximo objetivo que tem em mente. “Gostava muito de fazer uma série, porque em Portugal só fiz novelas. Não participei em séries, os Morangos por mais que se diga que é uma série, no fim do dia é uma novela”, conclui.